Talvez ainda me sobre a meninice de outrora, a juventude conjugada, a miúdes de sorriso pequeno, a célebre e incontestável vontade de vitória. Talvez ainda, seja quem fora, o que deixara, o que passara, talvez, ou não. O certo é que a vida gira e gira tanto, sem enfoque, sem reluz, sem brilho ou catecismo. Talvez seja o herói transfigurado, o silêncio emudecido, a vontade de não mais ser, o coloquial e cotidiano sobrepujar de medos, a alameda de segredos e vanglórias perdidas.
Hoje, sou o que sou e não posso mudar, o hoje ou o ontem. Ontem eu fora prosa, verso e amabilidade, hoje, sombras e rugas no rosto. Talvez eu esqueça que com o tempo tudo há de se esquecer, talvez o tempo me esqueça e eu faça dele esquecimento. Amanhã, talvez, quiçá não.
Na verdade, bem verdade, o resto é resto, o tempo vem e vai, sem qualquer viés de razão, sem solicitação ou cartão de visita. Pois bem, que me valha o que se fora e faça de mim o que não fora, talvez. São vozes do silêncio que se pronunciam em demasia e gritam em minha alma, inundando de paixão enfurecida e já tardia, talvez.
Ora, o que fazer com o resto que sobra, com a dor que desdobra, com a poesia em grande estilo, com a reforma dos sonhos, e sem nenhuma chuva ou maresia, calado me ponho. E fora tempo de alegria, jovialidade e descobertas, que hoje se valem em outono nublado e verões tão corriqueiros e forjados. A música vem e logo se vai, fica o gosto de perdão algum, a inquietude de pensamentos tolos e a forja de vitória perante o julgo da cobrança. Talvez eu nunca soubera ser bem alguém, talvez o fosse e jamais deixara de ser, talvez ainda esquecera do bom sentido de não ser, e assim crescendo se vai, para alguma direção, algum lugar, algum caminho, sem que o bom gosto de vinho fique salientado.
Bem, não sei, realmente não sei o que dizer de forma justa e ponderada, talvez ponderar não seja a minha melhor arma, e desarmado fiquei, sem escudo ou proteção, em guerras sem perdão, perante exército nebuloso que desloca-se no profundo do corpo. Ah, quanto há de se fazer por valer a valentia de tentar, a amargura que acumula-se sob a pele reta, e a retina dos olhos que brilha ao chorar, isso eu sei, e como sei.
São as vozes do meu silêncio mórbido e ultrajado, que em agonia se satisfaz dos meus restos resplandecentes e pernósticos. É a folha da vida que tremula em bandeira escorregadia. É o verão que se chega de novo, mais uma vez, pela última vez, tão corriqueiro como antes fora em vida.
Era de saber o resultado, de se esperar o inesperado, de prever em fantasia, como fantoche já ajustado, como rebelde despreparado para um futuro íngreme e venoso. Então como marionete, justifico tristeza afins, faço comunhão ao calor d’alma que morre inequivocamente, e deixo-me em paz que vai em sobra, outrora jamais.
São as vozes de um silêncio cordial, caudaloso e infectado por ser o que se é, querendo ou não. Perante vida que extingue, deito-me em pé, na maior e mais branda injúria que pudera haver, seja lá ou seja cá. Enfim, morro sem saber, porque nada ou ninguém pode salvar-me de garras invisíveis e incalculáveis que sobrepujam roupas minhas, de leveza e penúria, fantasia vestida e comportada em máscara e dias.
Talvez seja hora de calar, e deixar do que tenho, talvez seja como a pronúncia de testamento, sangrento e lento, talvez seja… Por ora justifico-me sem qualquer intenção de perdão, sem que haja leveza em mãos e que faça a unção bendita de pecados e mais pecados, do doloroso ato, e na mais épica traição, torno-me sinônimo do não.
Talvez silêncio maior seja morrer em vida e que neste e único momento, renasça sem demência o que outrora abdiquei em vida. No mais, são vozes do silêncio, cartazes efêmeros.
Autor: Romulo Danelli
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